Refutação à terceira pessoa

 
Não basta criar uma padronização de respostas, alterando o nosso jeito de pensar, nosso sistema de avaliação educacional também nos obriga a escrever em 3ª pessoa, muito presente  nos textos NÃO LITERÁRIOS (em especial o texto informativo e o dissertativo argumentativo, por questões de estrutura, objetivos e tipologia textual). Até aí, tudo ok.

Uma coisa me é curiosa: por que essa paixonite aguda pela terceira pessoa nos nossos textos? Para levar a sério a seriedade de escrever? Para dar impessoalidade à coisa que é escrita? Para fazer parecer que o texto surgiu do nada, ou que as palavras foram perfeita, seletiva e automaticamente encaixadas por um robô? Por que esse medo de criar uma proximidade com o leitor? Por que esse medo da flexibilidade?

Simplesmente

Por que?

Compreendo as regras de nossa língua portuguesa, assim como também compreendo a norma culta. Compreenderei, também, as respostas/justificativas que me forem dadas. Mas primeiro, cale a boca. Segundo, siga meu raciocínio. Não vivem falando por aí que as pessoas deveriam falar menos e ouvir e ler mais? Atenção: agora serei antitética em relação à minha opinião, expressa no título desse texto, por razões de melhor estruturação lógica.

Ao se escrever um texto, geralmente dissertativo-argumentativo, deve-se expor os argumentos e a opinião, claramente pessoal, daquele que escreve. Esse tem o objetivo de convencer quem ler suas ideias, demonstrando sua segurança e senso crítico no assunto. Bem, se o pensamento exposto é único, e o leitor deve se convencer desse, por que não demonstrar que os escritos não foram algo automático? Para não perder a formalidade?

Muitos escritores escrevem e escreveram formalmente sem o uso da terceira pessoa. Clarice Lispector está nesse grupo. Ela escrevia falando sobre si mesma, sobre o que pensava, seu cotidiano, tudo. E apenas expondo seus pensamentos, em primeiríssima pessoa e também na segunda, ela conseguiu convencer seus leitores acerca de algum fato da vida. E olha só: isso foi sem querer querendo. E OLHA SÓ O QUE É MAIS INCRÍVEL AINDA: OS JORNAIS ACEITAVAM O QUE ELA ESCREVIA. Tenho certeza que, nos dias de hoje, Clarice estaria enlouquecida com esse padrão. Pior ainda: talvez nem chegássemos a conhecer seu dom para a escrita, se não fosse por seu casamento com um diplomata (afinal, quem tem poder, atualmente, ganha mais crédito na mídia do que os que não o tem).

É claro que existirão momentos em que a 3ª pessoa será necessária, mas ela não precisa ser fixa. Richard Wollheim dizia que "a arte é uma forma de vida". Escrever é uma arte, e, como todos nós aprendemos, ela não depende do público, e sim do artista, de suas intenções, suas vivências. Logo, que mal há em não escrever em terceira pessoa? Eu não escrevo para os outros, escrevo para mim mesma.

Se eu escrevo certo, escrevo bem. Se escrevo bem, escreverei melhor ainda; e com esse melhor ainda, poderei convencer quem me ler de qualquer coisa que foi escrita. E sem fazer o uso apaixonado da terceira pessoa. Mas esta arte de escrever pessoalmente e de forma convincente se perdeu dentro de mim. Esse padrão para escrever tem sido tão forçado, que eu não tenho mais condições de expor minhas ideias normalmente.

Entro em colapso e sinto uma vontade absurda de rasgar o papel ou de bater em quem sugeriu a proposta de redação. Caramba, tem mínimo e máximo de linhas e tem toda uma regra cheia de frescuras para a ordem das coisas a serem apresentadas. E o corretor ainda tem a cara de pau de mudar o jeito que eu escrevi para uma conjugação horrorosa, que me leva a crer que eu sei mais que ele e perco pontos por conta disso. QUANDO EU FAÇO MINHAS REDAÇÕES NA CASA THOMAS JEFFERSON, NÃO É DESSE JEITO. O MODELO DE ESCRITA AMERICANO É EXATAMENTE O CONTRÁRIO DO BRASILEIRO.

Foram tantas notas baixas nas redações que fiz, devido à minha rebeldia à terceira pessoa (ela está destruindo meu dom para escrever), que juro a vocês, seriamente pensei em excluir o blog. Porque não há autoestima mais baixa que a de alguém que escreve, é reprovado e ainda por cima não recebe nenhum comentário de sugestão ou opinião. Porque esse é o trabalho do professor-corretor, mas ele não o faz. Nem mesmo quando ele ainda está ENSINANDO O ALUNO.

Assim, meus caros leitores, concluo: de quem é a culpa? Do querido sistema de ensino desse amado Brasil.

Comentários

  1. Eu entendo sua dor ;-;-; Fuck portuguese, let's just talk in english!!!

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